Será mesmo verdade que ter um gato ajuda a diminuir os níveis de ansiedade e stresse? E que o seu ronronar tem mesmo efeitos terapêuticos? Um psicólogo revela o que a ciência já descobriu e explica o fenómeno de popularidade por detrás dos vídeos com gatinhos.

 Com Pedro Mateiro
Psicólogo clínico

 

Quem tem um ou vários gatos em casa por certo já reparou que fica sempre mais relaxado quando o acaricia ou brinca com ele. É infalível: por mais que o dia tenha sido stressante, por muitas discussões que tenha tido com um colega de trabalho ou com a cara metade, os problemas parece que perdem intensidade depois de interagir com o seu gato e de ouvir o seu ronronar. Mas será que existe alguma explicação científica para este “dom” felino? Serão os gatos os nossos verdadeiros melhores amigos?


De acordo com um estudo elaborado pelo Human Animal Bond Research Institute (HABRI), que abrangeu 2000 pessoas com animais de estimação, 74% relataram uma melhoria na sua saúde mental decorrente da relação com o seu animal de estimação e 75% relatam melhoria da saúde mental de um amigo ou familiar devido à presença de um animal de estimação”, revela o psicólogo clínico Pedro Marteiro.

 

Afinal, o que é a ansiedade?

Trata-se de uma reação normal ao perigo ou ao stresse do dia-a-dia.

“Pode apresentar-se como uma sensação de medo perante uma ameaça ou uma preocupação face algo que poderá acontecer e que teme ser negativo”, explica.

 “Na ansiedade há sempre um raciocínio antecipatório, com a pessoa a procurar a solução para problemas que muitas vezes ainda não se estabeleceram no seu formato final e/ou para os quais ainda não têm todas as informações que permitam criar uma solução. Quando a ansiedade é demasiado intensa e/ou recorrente, persistindo além do evento desencadeador, pode tratar-se num problema mais sério de saúde mental”.

 A presença de um gato terá sempre efeitos benéficos na qualidade de vida percebida pelas pessoas, “logo à partida porque reduzem a sensação de solidão”, explica o especialista. “O gato tem uma postura normalmente independente, quase indiferente (quando comparado a um cão, por exemplo). Ainda que brinquem e interajam com os humanos, por norma fruem de momentos tranquilos, longas sestas, deslocam-se silenciosamente e vão transmitindo uma mensagem que é reconhecida pela nossa amígdala como a inexistência de perigo, o que, ainda que não desligue a ansiedade, apresenta uma informação oposta que a vai pontuando”.

 

O poder do ronrom

Apesar da controvérsia face ao efeito do ronronar dos gatos na saúde dos tutores, “há estudos que apontam o ronronar como um som com efeitos terapêuticos (entre os 20-140 Hz, sendo esta uma frequência conhecida por ter efeitos curativos para as doenças humanas) e outros estudos que desmontam esta ideia”, aponta Pedro Mateiro.

 “Não pegando na física do som e relacionando com abordagens terapêuticas na psicologia (sobretudo na cognitivo-comportamental de terceira geração), há um grande enfoque na necessidade de parar o pensamento e comportamento que fluem diariamente em modo de piloto-automático e promover momentos de consciência plena. Para esta dinâmica (também conhecida por mildfulness), o paciente é convidado e meditar, centrar-se no “aqui e agora” e são usados diferentes estímulos (visuais ou auditivos). Podem ser utilizadas músicas relaxantes, sons da natureza, “white noise” e, porque não, o ronronar de um gato”.

Este som suave, constante e não carregado de imagens de agitação ou stresse (muito pelo contrário) é um excelente facilitador deste processo e pode intencional ou acidentalmente criar momentos de consciência plena, com todos os benefícios que lhe são reconhecidos.

 

E ver vídeos de gatinhos, ajuda?

“Um estudo da Indiana University Media School, publicado no Journal Computers in Human Behavior, revela que ver vídeos de gatos pode aumentar a energia do utilizador, aumentar emoções positivas e reduzir pensamentos negativos. Contudo, não há informação sobre o “porquê”, apenas opiniões que sugerem que o sucesso se deve a uma fórmula: “criaturas adoráveis a fazer coisas inesperadas e engraçadas”.

“Se nos descentrarmos do fenómeno e voltamos ao que conhecemos do cérebro humano, verificamos que este não conhece a instrução “não”. Se lhe dissermos “não pense na porta de casa pintada de roxo” ou “não pense num elefante com asas”, a mente irá imediatamente construir esta imagem. Do mesmo modo, quando dizemos “não pense no que o preocupa” ou “não pense que o pior vai acontecer”, imediatamente a mente irá fazer exatamente o posto”, explica o psicólogo.

“Não é possível condicionar o pensamento neste sentido, mas é possível mudar o foco. Assim, se ocupar a mente com atividades lúdicas, descontraídas e divertidas (por exemplo, os vídeos de gatos que aparentemente têm uma fórmula de sucesso para a diversão), vai conseguir descentrar-se de pensamentos “agressivos” e fruir de momentos de descontração ou de alguma paz face ao que o perturba.”